segunda-feira, março 08, 2010

Lachrimae

Meu nome é rio da desgraça, imperfeito ser de tão trágica raça que não esconde o desencanto, a virtude de se ser maldição mordaz onde já viveu a esperança, onde já brilharam olhos de criança e caíram as pétalas de amargura sem leito a colher...
Vi-me distante de toda a luz, apenas por ser da minha cor o cinzento esparso que tomou a dor como pátio de abraços já frios, onde já houve riso mas desde há muito que já não existe os sorrisos que criaram estradas de apaixonadas cantigas que em bem estar me adormeciam...
Desde há muito, sou a palidez de um espelho envelhecido pela insónia do viver, o tormento de tanto desejar e em mágoa saber... já não rio, já não brilho... espera-me apenas morrer...
Os contos que dei a conhecer são já pálidas lágrimas da minha alma pois este futuro inquietante, desconhecido e, mesmo assim, hesitante, traz tão cruéis palavras que transpiram sonolência exacerbada, por querer desaparecer antes da próxima madrugada.
Sem vida nos pulmões, seda que dê cor à imaginação, tenho apenas a prova de tudo o que fui, ruiu há instantes, por nada do nada conseguir criar, nada do nada ter para amar…
Aprisionado na caverna das lamentações, sou eremita da minha própria alma, a secura de noites mascaradas, um soluçar desperdiçado onde chove a todo o momento, onde nem um fio de luz se queda. Não há momento onde não me sinta o confuso, o desgraçado, o recluso, o indesejado, o morto cujas pernas são escolhos e os olhos ruínas…
São estes gritos que me cortam, que me transformam em restos de um passado que já era cinzas, que tragam a água que os meus lábios desejam… sei o que é perder… estive lá, nesse recanto furibundo que transformou a maldita luz em nada, na saga de um silêncio aprisionado…
Sou o corpo abatido que sabe como ler a noite escura e que conhece o sono dos empoeirados, aquele que diz o que é ridículo e aquele que diz que quem quiser conhecer o que é ser podridão, acorde-se ao espelho de manhã, veja as rugas que o Tempo criou… e morra… tal como ontem morri…

2 comentários:

Daisy Libório disse...

Há sempre esta dúvida do que é real, do que é parcialmente real,
do que é imaginado...

deve ser pelo motivo de que agarras com força a palavra na sua essência, de tal forma que tudo fica vivo...

bons ecritores causam isso: faz a dor, a beleza, a felicidade, o terror, o riso (e tudo mais) estender-se até os sentidos de quem o lê...

sofro com o sofrimento expresso
vivo com a vivacidade expressa...

Lindíssimo...
Bjs

Jorge Ribeiro de Castro disse...

A cadência de uma alma que desperta para a escuridão mesmo assim ainda brilha... embora a palidez a faça cair em desespero...
Tentarei sempre me erguer as vezes que forem necessárias:)))
Agradecido pelo apoio, kida:)*
bjs