domingo, julho 07, 2013
excerto de "Que fortuna o mar esconde"
Para minha ruína, fui traído por em quem confiança tinha mas que mostrou ser a concórdia com tudo o que regia essa serpente primordial. Quão vil é a ganância, uma doença tão absurda quanto a peste que se deleita com o sofrimento de outros em nome de uma riqueza que corrói a alma! Uma noite e já tudo tinha sido esquecido…
Agora, como sentinela de uma espera há muito amaldiçoada, as lágrimas que cobriam o meu olhar tinham o riso de quem já não sabe como ser feliz, um coração espezinhado pelo toque de um sorriso que guardo no íntimo, o devaneio que uma cansada magia oferece ao pudor de nada poder fazer. Sejam leves ou pesadas, as lágrimas tinham sempre a mesma acidez que revoltava, um destino onde a mais pobre nobreza surgiu incauta e cortou todas as asas que nós, anjos, possuíamos para voar.
Após um sono onde toda a beleza me conquistava, acordei numa cama vazia, perdido entre os lençóis ainda quentes por antes terem coberto os corpos de dois amantes. Vários homens a rodeavam com espadas na mão e expressões de escárnio como se todos estes anos tivessem sido de lamentos e abusos.
O que tinham feito à minha rainha? Estariam os meus filhos bem? Que mal tinha feito a estes meliantes para ameaçarem o reino e a família regente? Será que detestavam saber que a maior harmonia que podia adornar a Vida seria dormir e acordar feliz? Será que o respeito, a compreensão e a felicidade não serão os mais valiosos sonhos que desejemos realizar?
Infelizmente, às minhas perguntas nenhuma resposta satisfatória surgiu, apenas insípidas ordens que cortavam ainda mais a vontade de sorrir. O ultraje era ser rei de todos e saber que existia quem não quisesse a sóbria conduta que nascia do meu desejo.
Humilhado, fui conduzido à sala do trono e conheci uma assembleia de meliantes, liderada por Daiken-Melchior, todos pretendendo deturpar tão estimada harmonia. Até então, esse era o meu mais nobre conselheiro mas, nesse momento, sentado no meu trono, me olhava com um ódio que nunca lhe conheci ao qual eu respondi com a perplexidade.
As suas palavras atingiram-me com a vileza da infâmia, aquela sensação de que não existe desespero maior do que saber que a vida que se conhecia já não mais existe, que a liberdade era um fôlego sem fulgor. Eu era agora um rei destronado porque não desejava adicionar à grandeza ao meu reino atacando os reinos vizinhos de modo a ter mais terras e fortuna.
- Prefiro ser o mentor do meu povo rumo à harmonia e não o causador da sua perda! – gritei, convicto da sabedoria das minhas palavras.
- O nosso povo não tem mais fortuna do que a que tinha no reinado do rei Alexis!!!
- Mentira! Somos agricultores, pescadores, arquitectos, artistas, comerciantes…
- Uma riqueza tão estável como a água de um lago onde nem a chuva nem o vento infligem a sua magnificência.
- Como tudo leva o seu tempo, ainda estamos a aprender a melhorar os dons que todos têm…
- E quanto tempo levará para chegarmos ao nosso auge??? Não merecemos ser mais do que ovelhas? Não merecemos ser lobos com sede de conquista???
- E fazer mal a quem nunca nos fez mal???
- Fazer bem ao nosso povo que merece muito mais!
- O nosso povo ou tu?
- Basta!!! Não ponhas a ridículo o que merecemos!!! Tragam a rainha!!!
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